quarta-feira, dezembro 06, 2017

Doping do desporto soviético. Contamos lhe como foi (4 fotos)

No momento em que o COI proibiu a participação da seleção russa nos JO-2018 de Pyeongchang, devido à criação e existência do programa do doping estatal, importa investigar as raízes do doping soviético, a base do atual doping russo. Desde a época pós-II G.M., os desportistas soviéticos usavam doping: o regime comunista apresentava as suas vitórias desportivas como “evidências científicas” da superioridade do socialismo real soviético.

No entanto, as vitórias desportivas soviéticas também serviam para a propaganda interna, dando às pessoas temas de conversas e de orgulho bacoco: em vez de pensar sobre a falta do papel higiénico ou alimentos mais básicos, o cidadão soviético podia se orgulhar dos feitios desportivos do país. Naturalmente, neste processo ninguém se preocupava com a saúde ou bem-estar dos desportistas, as vitórias eram exigidas “custe o que custar”. Depois da sua saída da ribalta, as antigas estrelas caiam na bebida, esquecimento e marginalidade, na década de 1990 eles também entraram, em força, no sub-mundo do crime organizado.

Metandienona para culturistas e halterofilistas

A metandienona é uma droga bastante antiga, foi desenvolvida nos anos 1950, mas é usada até hoje com sucesso. Pertence ao grupo dos esteróides anabolizantes e é usada principalmente por aqueles que fazem desportos pesados, como levantamento de peso ou lançamento do disco – proporciona um aumento rápido dos músculos e aumento a força em 5 vezes, devido ao aumento da testosterona no corpo do atleta. A droga, conhecida simplesmente como “metano” é muito perigosa e tóxica – envenena o fígado, organiza a retenção de água no corpo, aumenta a pressão arterial.

A metandienona foi usada em massa na Europa na década de 1960, fabricada pela alemã Bayer e pela húngara Gedeon Richter, que produzia “metano” sob o nome de Nerobol. Este Nerobol húngaro foi fornecido principalmente à URSS – adquirido em grandes frascos de 500 comprimidos cada e distribuído aos atletas à uma taxa de dois comprimidos por dia, em larga escala após as Olimpíadas do México de 1968. A droga era distribuída juntamente com vitaminas, e muitas vezes os atletas soviéticos nem sabiam o que estavam consumindo.

Na época havia pouquíssimos testes de doping, havia poucos laboratórios, o controlo de doping era realizado somente em competições importantes, era muito seletivo, a verificação repentina seria considerada como uma “provocação política”. Uma verificação deste tipo aconteceu em Paris em 1984 - a “lenda do atletismo soviético” Tatyana Kazankina  foi inesperadamente convidada para um teste de doping, não compareceu, o que, de acordo com os regulamentos da IAAF foi considerado um “resultado positivo de doping”, que valeu lhe a suspensão de dois anos e ditou o seu abandono do desporto da alta competição.

Tatyana Kazankina (na primeira foto de vermelho e na foto em baixo no centro):
Naquele mesmo 1984, no final do outono, foi cancelada a participação das corredoras soviéticas (líderes absolutos e recordistas mundiais) ao campeonato nos EUA [sem relação ao boicote soviético dos JO-1984 em Los Angeles]. Depois disso, todos os atletas soviéticos passavam pelo controlo antidoping das autoridades soviéticas. Se controlo detetava a droga, o atleta faltava à competição sob o pretexto de uma lesão, exames no instituto, a doença de algum familiar, o sistema de encobrimento funcionava sem problemas.
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No final dos anos 1980, surgiram as tecnologias da detecção dos resíduos de metano no sangue de longa duração, e a droga deixo de ser usados ​​massivamente no treino pré-competitivo, mudando para as substâncias mais “discretas”.

Eritropoietina e ecstasy

Nos anos oitenta, com aparecimento do maior número de testes de doping e inspecções surpresa, os treinadores e atletas começaram a procurar outros meios para a “tonificação”. Alias, muitas vezes os atletas soviéticos não procuravam nada, falsamente “amadores”, faziam o que os treinadores e comités desportivos mandavam à fazer, sem fazer as perguntas e muitas vezes nem sequer saber o que consomem.

Eritropoietina surgiu em 1983 – uma hormona que estimula a produção de células vermelhas do sangue a partir das células progenitoras finais, e aumenta o rendimento de reticulócitos de medula óssea, dependendo do consumo de oxigénio. Simplificando: é uma cópia do hormona do rim, aumenta a quantidade de hemoglobina no sangue e melhora significativamente a resistência. Eritropoietina praticamente copiava o hormona natural, e era muito difícil de ser detetado, pelo menos até o início da década de 2000, se usava na União Soviética após o aparecimento da testagem efetiva contra o uso da “metano”.
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Além dos hormonas e anabolizantes, aos atletas soviéticos muitas vezes era dado todo o tipo drogas como ecstasy e efedrina. Ambas apareceram em finais dos anos 1970 e imediatamente entraram no desporto – reduziram a fadiga durante o exercício e aumentavam a resistência, mas com enormes efeitos colaterais – danificavam o sistema nervoso, resultando em cansaço, letargia e depressão, e em perspetiva levavam à destruição e senilidade precoce do organismo, algo que os treinadores não explicavam aos atletas.

Nos Jogos Olímpicos de 1976, em Innsbruck, no organismo da esquiadora soviética Galina Kulakova foi encontrado efedrina – mas ela foi banida apenas numa única corrida, dado que foi dado como provado que ela ingeriu a efedrina num spray nasal, e a própria atleta podia não saber disso.

Galina Kulakova:

A felicidade de não saber

Possivelmente Galina Kulakova realmente não sabia o que ela estava injetar no corpo, assim como muitos atletas soviéticos usavam “metano”, pensando que estavam tomando simples vitaminas. Houve casos em que os atletas soviéticos concordaram em fazer o teste de doping, tendo certeza de que eles estavam “limpos” – e eram apanhados. E às vezes os atletas soviéticos simplesmente recebiam a ordem de não fazer testes de doping, sem explicar os motivos, como aconteceu no caso de Tatyana Kazankina, de quem falamos anteriormente.
Afinal, na URSS, os atletas poderiam simplesmente serem usados, “as cegas”, para demonstrar altas realizações do desporto soviético, e os próprios atletas nem sequer suspeitariam do uso de doping? Não será de ficar surpreso se isso fosse verdade – a URSS sempre quis parecer uma “superpotência”, usando as pessoas comuns para esse fim, nos seus próprios interesses políticos e propagandistas.

Fotos: GettyImages | Texto: Maxim Mirovich

Blogueiro: existem duas diferenças fundamentais entre o doping nos países comunistas e os restantes países do mundo. Nos países comunistas os atletas praticamente não podiam escolher usar ou não usar o doping, a recusa automaticamente significava a sua exclusão da modalidade. E depois, a questão financeira. Nos países comunistas os atletas recebiam 10% ou menos dos prémios que tinham ganho, com o resto ficava o Estado. Nos países capitalistas os desportistas tinham toda a possibilidade de amealhar algum capital e abrir algum pequeno negócio: a loja, o café, o ginásio. E nada disso era possível ou permitido nos países comunistas...

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